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Saiba como surgiu a lenda da Praga do Arubinha Sexta-feira, 31/12/2021 – 03:40 A “PRAGA” DE QUEM NÃO JOGOU E O SAPO QUE NUNCA EXISTIU
O DOZE A ZERO DO VASCO SOBRE O ANDARAÍ DE ARUBINHA
Passou ontem mais uma data natalícia da estrepitosa vitória vascaína sobre o humilde Andaraí, o clube de futebol da Fábrica de Tecidos Confiança(1), que não resistiu ao tempo e extinguiu-se em meados dos anos 50 do século XX.
Todos conhecem a história advinda daquela partida, a praga rogada pelo folclórico Arubinha, conhecido como “pai de santo” e jogador típico das ligas suburbanas e dos pequenos clubes da divisão principal, como o Bonsucesso e o próprio Andaraí, que naquele ano de 1937 e início de 1938 tomou as maiores goleadas já sofridas em campeonatos oficiais.
A “praga folclórica” foi romanceada pelo gênio de Mario Filho em uma de suas crônicas, onde estampou nas suas belas linhas a famosa dita do que teria sido rogado: “Se há um Deus no céu, o Vasco tem de passar doze anos sem ser campeão”. (clique aqui para ler a crônica de Mario Filho no semprevasco.com)
Tudo em virtude do score aplicado pelo brilhante scratch dos Camisa Negras naquela partida, ocorrida na noite de quarta-feira, 29 de dezembro de 1937(2).
Vamos revisitar alguns acontecimentos daquela partida, e apresentar a origem da tal “praga” para que não permaneça distorcida na memória vascaína a verdade sobre os fatos redesenhados pelo mito a partir daquele episódio.
A IMPRENSA JÁ ESPERAVA A VITÓRIA MAIÚSCULA DO VASCO SOBRE O ANDARAÍ
A expectativa acerca da vitória do Vasco não era inesperada. O Andaraí já vinha sendo derrotado fragorosamente por seus adversários, e o Vasco seria mais um a acachapar-lhe outra goleada. Tanto assim que uma pequena nota publicada no Jornal dos Sports já atestava o que viria a ser a maior goleada já aplicada pelo Vasco naquela certame:
“ANDARAHY E VASCO, NO STADIUM GUANABARA
O prelio mais fraco da rodada reunirá as equipes do Vasco no Stadium Guanabara. Os vascainos surgem como franco favoritos e não devem ser mesmo ameaçados pelos andarahyenses, que continuam a cumprir performances fracas nesta temporada. Todavia, espera-se uma luta interessante, porquanto os alvi-verdes, pisam o gramado dispostos a resistir bravamente, vendendo caro a derrota. Mas, nem assim a contagem será desfavorável ao gremio da Cruz de Malta…” (Jornal dos Sports – 29 de dezembro de 1937)(3)
O ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO QUE QUASE IMPEDIU A REALIZAÇÃO DA PARTIDA
O Vasco estava em festa, pois naquele dia o Conselho Deliberativo acabara de eleger por unanimidade o Professor Pedro Novaes como presidente do clube para o mandato seguinte, sucedendo Jorge Bhering(4), que alçara o Vasco à condição de campeão de futebol profissional de futebol de 1936 pela Federação Metropolitana de Desportos(5).
Naquele tempo, as equipes de futebol ainda mantinham a prática de se deslocar para seus jogos através de automóveis particulares ou de táxis. E assim foi que a equipe vascaína fez, partiu em diversas comitivas para o estádio do Fluminense, na então Rua Guanabara, onde o Andaraí era o mandante.
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Em uma da comitivas partiram Joel, Kuko, Oscarino, Rey, Mamede e o massagista Joaquim Francisco da Costa. O táxi dirigido por Horacio Benigno da Rocha, ia animado pelas conversas acerca da peleja. Ao chegar à altura da rua Francisco Eugênio, vindo pela rua Figueira de Melo, na curva que ali existia, foi colhido inesperadamente pelo caminhão da Limpeza Pública, dirigido pelo motorista Antonio Domingos Garrancho. Com o choque, o caminhão da municipalidade subiu a calçada e colidiu no prédio em frente e o táxi com os players vascaínos ficou prensado causando-lhes diversos ferimentos.
Imediatamente socorridos, os jogadores foram hospitalizados no Hospital do Pronto Socorro (atual Souza Aguiar), somente com pequenas escoriações, exceto por Oscarino que mais tarde foi transferido para o Hospital Evangélico, em razão da fratura que sofreu na 13.ª costela(6). Os motoristas nada sofreram.
A ESCALAÇÃO DO VASCO – HOUVE OU NÃO ATRASO?
O Vasco, que para aquela partida entrou em campo com: Joel, Zé Luiz e Italia – Poroto, Zarzur e Calocero – Armandinho, Alfredo e Niginho – Feitiço e Luna, teria atrasado sua entrada em campo por motivo de força maior, em virtude de seus dois goleiros (Joel e Rey) estarem no auto acidentado. Com a chegada de Joel, que foi liberado, a partida finalmente se iniciou, sendo Oscarino substituído pelo back Poroto. No entanto, nenhum jornal noticiou qualquer atraso da partida naquela noite chuvosa de 29 de dezembro. Ao contrário, o jornal “O Radical” assinala que ambas as equipes surgiram no gramado às 21:15h no gramado do estádio da rua Guanabara(7), no horário típico dos jogos noturnos daquele verão do fim de ano de 1937.
A VITÓRIA DO VASCO – NIGINHO, O ARTILHEIRO COM 4 GOLS ASSINALADOS!
O Vasco, demonstrando a sua força, confirmou as expectativas e aplicou sua segunda maior goleada em campeonato carioca: 1.º gol – Luna; 2.º gol – Luna; 3.º gol – Niginho; 4.º gol – Feitiço; 5.º gol – Niginho; Joel defende um pênalti contra o Andaraí, batido por Leão; 6.º gol – Alfredo; 7.º gol – Alfredo; 8.º gol – Niginho; 9.º gol – Luna; 10.º gol – Niginho, de pênalti; 11.º gol – Niginho; e 12.º gol – Alfredo.
A ESCALAÇÃO DO ANDARAÍ. CADÊ ARUBINHA?
Nessa partida lendária, em que o Vasco jogou em ritmo de treino forte, como destacaram alguns periódicos da época, o Andaraí atuou com a seguinte equipe: Hermes (depois Gaúcho, após o 4.º gol); Dondon (Gibi) e Esquerdinha; Barata, Bolinha e Cabinho; Nico, Astor, Hugo Bianco e Leão.
Arubinha simplesmente não jogou aquela peleja!
A ORIGEM DA “PRAGA”! CADÊ O SAPO?
A origem da “praga” é muito simples, surgiu a 18 de fevereiro de 1938 com a publicação de uma “nota jornalística” de aspecto galhofeiro, em que se conta a visita de Arubinha ao jornal O Radical, finamente trajado no mais elegante terno branco de verão, típico da malandragem carioca.
Transcrevemos abaixo a origem da “praga” piadista de Arubinha:
“O Vasco e a praga de Arubinha
FICARÁ DOZE ANNOS SEM SER CAMPEÃO – NOTAS
Lá vem o “seu” Aruba, pupilo do Graveto, “desguiando-se” dos pingos que molham a “Cidade Maravilhosa”. Sobe as escadas de nossa redacção. Depois de descansar um pouco, o ponta esquerda que já defendeu com brilho as cores do Bomsuccesso, Magno, Modesto e Andarahy começou a falar.
E, o player que ao lado de Nóca formou a famosa ala indigésta do Magno, referindo-se a uma noticia publicada por um collega nosso teve a seguinte phrase:
– É fantasia o meu reingresso no Magno. Estou firme nos “Leões de Quintino”
A PRAGA NO VASCO
A seguir, commenta-se a fraca performance do Vasco, nestas ultimas partidas.
Arubinha olha para o lado tres vezes, e pondera:
– É praga. O Vasco, sem dó nem piedade surrou-nos. Não joguei, mas fiz a minha reza. O Vasco ficará 12 annos sem ser campeão. O Botafogo sabe quanto pesa um “trabalho”, pois em 1910 “sapecou” o Mangueira de 24 X 0 e a praga pegou.
Mais algumas palavras e o nosso amigo Arubinha deixou a redacção.”(3)
CONCLUSÃO
I) Os que torcem contra, excluíram o campeonato de 1936 para a contagem da “praga” que não pegou. O fazem a partir de 1934, para fazer valer uma inverídica diferença de 11 anos até o título invicto de Campeão de Terra e Mar de 1945, conquistado pelo Expresso da Vitória!;
II) Arubinha não jogou pelo Andaraí naquele 12 a 0 imposto pelo Vasco!;
III) Arubinha nunca enterrou sapo algum em São Januário, afirmou tão somente que fez a sua “reza”, assim como todo Pai de Santo fazia;(8) e
IV) A lenda contada na maravilhosa crônica de Mario Filho, é um belo e extraordinário conto com elementos folclóricos.
—
(1) O complexo fabril ainda existe na rua Maxwell e pertence ao supermercado Extra Boulevard. (2) Essa é a data correta da partida. (3) Grafia original da época (4) Jorge Bhering de Mattos foi eminente sportman, como nadador e jogador de water-polo. Empresário, era um dos donos do complexo fabril-familiar da Chocolates Bhering. (5) Federação Metropolitana de Desportos, liga profissional da qual participavam Vasco e Botafogo nos primeiros anos do profissionalismo, restando América, Flamengo e Fluminense na amadora Liga Carioca de Futebol. (6) Tudo conforme apurado nos jornais Correio da Manhã, A Noite, Jornal dos Sports, Gazeta de Notícias e O Radical de 30/12/1937. (7) O estádio da rua Guanabara, atual rua Pinheiro Machado. (8) Pai Santana, nosso eterno massagista e Pai de Santo, fazia por nós. Quem não se lembra dos ovos enterrados por Pai Santana no jogo contra o Cruzeiro no Mineirão (1974), como relembrado no blog A Costeleta (clique aqui para ler)
Fonte: Memória Vascaína (texto), A Noite (fotos), O Radical (foto)
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Fonte: vasconet.com.br/2021/12/31/saiba-como-surgiu-a-lenda-da-praga-do-arubinha